O que é que se vê da 1.ª Linha? Coisas pavorosas durante a noite, quando a lua ou os "very-light" iluminam a Terra de Ninguém. À frente do parapeito, a rede de arame farpado; um verdadeiro inferno inventado pelo diabo para não deixar descansar o soldado. Todas as noites era preciso consertá-lo; todas as noites o inimigo cortava um pedaço.
Na Terra de Ninguém (Colecção particular) |
A seguir, começam a chover granadas sobre o abrigo do comandante da companhia na razão de uma por segundo. Pelo ar voavam destroços de madeira, de arame, terra...latas de conserva, estacas, etc., etc.
Neste inferno, para se fazerem ouvir, os oficiais gritavam furiosamente as ordens aos ouvidos dos homens, como se lhes fossem morder as orelhas. O comandante da companhia quer comunicar com o do batalhão: impossível; estão as ligações rebentadas. Manda uma ordenança com um pedaço de papel onde à pressa escreveu:- «violento bombardeamento sobre a 1.ª Linha e trincheiras de comunicação. Tudo recolheu aos abrigos».
Máscara anti-gás modelo P de 1915 (inglês) utilizado pelo CEP (Colecção particular) |
A nossa artilharia, sempre pronta, começara a responder havia já um quarto de hora; mas o estrondo das granadas inimigas em torno da nossa gente era tal, que não deixava perceber que a nossa artilharia fazia já fogo, e que as nossas granadas faziam voar o inimigo para fora das suas trincheiras.
(Colecção particular) |
De súbito, parou o bombardeamento, embora persistindo mais para os flancos. A metralhadora do nosso lado direito cessou de funcionar, a sua guarnição caíra toda e o inimigo aparece no parapeito; a esta vista, o pelotão concentrado num dos flancos, rompe fogo; os alemães surpreendidos, recuam; o comandante do pelotão salta para o parapeito e atrás dele os seus soldados que caiem sobre o inimigo que rola para a Terra de Ninguém.
Os nossos soldados descarregam as espingardas sobre eles: chovem granadas, batem-se à baioneta com os alemães os soldados do 34: mais para a direita, sobre o monte de ruínas do parapeito esburacado pelas granadas combatem à baioneta os soldados do 34, do 15 e do 13... outros militares acodem e o inimigo desaparece...
O bombardeamento, agora, incidia feroz sobre as nossas baterias; uns poucos de abrigos de peças estavam esborrachados, as guarnições soterradas; noutros, os artilheiros continuavam aos pulos, furiosos, como demónios, carregando e despejando as suas peças. E o fogo aumentava de intensidade; os comandantes de bateria activavam o remuniciamento, não fossem faltar munições quando eram precisas.
Na frente fizera-se a calma, e os maqueiros levantavam e transportavam os feridos e mortos. Os comandantes de pelotão tomavam nota das perdas e das reparações a fazer. O Brigadeiro veio logo às linhas saber o que se passara.
Artilheiros portugueses (Colecção particular) |
Na frente fizera-se a calma, e os maqueiros levantavam e transportavam os feridos e mortos. Os comandantes de pelotão tomavam nota das perdas e das reparações a fazer. O Brigadeiro veio logo às linhas saber o que se passara.
Quando os telegramas publicados nos jornais diários dizem:
- «Sossego em toda a frente»,
o bom cidadão que lê o "Diário de Notícias" ao mesmo tempo que sorve o seu café com leite matinal, diz consigo ou para a família:
- «Estes diabos da tropa sempre têm uma sorte!»
(Colecção particular) |
O que este bom burguês-amigo ignora, é que o «sossego em toda a frente» dos telegramas significa uma noite com um ou dois incidentes, como o que acabamos de narrar, com pouco relevo; é que esse «sossego» , que põem o cidadão tão desdenhosos para connosco, representa uns mínimos de 8 a 10 mortos e 30 a 40 feridos!
In: A Grande Batalha do CEP pelo General Gomes da Costa.
Coordenação do texto e imagens: marr